Pense
em um gênero cinematográfico de um fascínio tão amplo no público
a ponto de, mesmo décadas após o fim de sua era, ainda ser capaz de
influenciar inúmeros cineastas, inspirar replicações de suas
características em vários países, ainda conquistando fãs, e o
mais impressionante: contribuir pra que por saudosismo numerosas plateias viessem a ignorar as tantas cagadas do filme “Django Livre”, do
Tarantino.
Esse é
o western, ou faroeste, ou “filmes de bangue-bangue”, pros que
assim preferirem nomear, que em uma análise superficial costuma ser
resumido em filmes de “mocinho e bandido”, ainda que, obviamente,
tenha conseguido ir bem além disso.
Filmes
que nem o “Keoma”, tema dessa postagem, não
necessariamente pervertem o que se conhece por western, mas com
certeza trazem muito mais que o visível na superfície.
Quem
sabe, dos faroestes de longa data, esse possa ser um dos mais
facilmente visados pelo público recente do gênero, exatamente por
trazer o nome de Franco Nero estrelando a produção, que por
mais que surpreenda muitos, não protagonizou apenas o clássico
“Django”, do Sergio Corbucci.
Um de
seus tantos outros trabalhos foi este “Keoma”, que é
considerado por muitos um dos últimos bons westerns da era dos westerns.
No
filme ele interpreta o mestiço personagem-título, que por sua
ascendência indígena viveu na condição de bastardo em uma
sociedade que sempre fez questão de jogar isso na cara dele.
Mas
nada disso nos é apresentado de uma vez.
O
clima fantasmagórico do começo mostra um alquebrado protagonista,
após uma grande guerra, que retorna à sua terra com algum ímpeto
não claro, mas que tem grandes chances de resultar em vingança.
A
condução do diretor Enzo G. Castellari não é nada convencional
enquanto apresenta um enredo que poderia ser simples e batido.
Cada
cena tem um estilo forte, o que ajuda pra que qualquer opinião
formada se desfaça logo, a respeito roteiro.
Ainda
que tenha sim tiroteios, vingança, e outros elementos comuns aos
faroestes, este é um exemplar diferenciado.
Eu
poderia nesse ponto elogiar com fervor a trilha sonora perfeita e impactante,
com temas que trazem um ar melancólico à narrativa, ou os tiroteios
coreografados com precisão, e que em câmeras lentas bem empregadas
tornam-se momentos poéticos e violentos, e que são com certeza
alguns dos pontos altos da jornada de Keoma.
Porém,
prefiro mencionar que juntamente com o roteiro bem amarrado e
intensidade das atuações, esses elementos todos funcionam de uma forma harmoniosa que supera uma avaliação de um deles individualmente.
Se em
um blockbuster cotidiano de hoje em dia muitas vezes o que o torna
pelo menos razoável são os efeitos, ou a atuação de um ator
isoladamente, ou apenas a direção de fotografia, sendo que o
restante constrange pela comumzice, “Keoma” é um baita
exemplo de excelência na utilização dos recursos que o diretor põe em prática.
Mesmo
quando em um embate detalhes simples como a contagem de balas
disponíveis na pistola, já marcando a quem elas estão endereçadas
é feita com criatividade sendo mais interessante que muitos duelos
inteiros, ou quando em uma briga de rua os atores parecem estar
dominados por uma fúria legítima e que resulta em uma pancadaria
sem frescuras ou poses heróicas a cada golpe, o somatório de
intensidade se sobressai, porque não são aspectos que funcionam
somente individualmente.
Enquanto
obra de ação muito intensa, não deixa isso estar acima da busca do
espectador por quem é o protagonista e o que o motiva.
As
respostas aparecem aos poucos, sem enrolação, e no final do filme
realmente é possível compreender as atitudes dos envolvidos, seja
por ambição, vingança, desprezo, rancor, ou culpa.
Conforme
eu já deixei dito acima, “Keoma” não é uma quebra de
paradigmas cinematográficos.
Melhor
não assistir esperando isso.
Ainda
é a história do anti-heroi pistoleiro que vaga solitário rumo a uma espiral
de matança.
Mas o
que diferencia é saber usar tudo à disposição pra tornar essa
história não apenas mais uma, e sim uma história que permanece com
quem assiste mesmo quando não é indicada ao Oscar, ou não bate a
marca de bilheteria tal.
Um verdadeiro e poderoso filme, e não um videoclipe no qual apenas o visual e exageros
importam.
Por
isso, se os westerns ainda influenciam e cativam, “Keoma”
com certeza tem sua parcela de responsabilidade quanto a isso.
Quanto
vale:
Keoma. Recomendado para: quem não quer ver um arremedo interessado apenas
em homenagear o gênero. Pra quem quer ver um bom western.
Keoma
(Keoma)
Direção: Enzo G. Castellari
Duração: 105 minutos
Ano
de produção: 1976
Gênero:
Faroeste/Ação
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