São necessários vários minutos até que o propósito de Michael Haneke se manifeste.
É um processo lentíssimo
e inundado por longos momentos de silêncio que acompanha o
espectador até que os interesses do cineasta vão ficando claros. Não
é um twist espertinho ou o humor fácil por vezes motivado por doses
elevadas de sangue falso em meio a ação hypada e clichê, ou uma
redenção ao som de uma trilha sonora edificante o que aguarda o
público.
Assistir o filme “Amor”,
novo trabalho do diretor austríaco multipremiado, e que já realizou
os longa-metragens “Caché” (2005), “Violência
Gratuita” (2008), e “A Fita Branca” (2009), é
observar de perto uma dolorosa e inevitável caminhada rumo à morte.
Mas Haneke não
tenta enganar ninguém.
Sem maneirismos ou closes
em rostos tomados por lágrimas, e nem mesmo a trilha sonora
edificante.
Trilha sonora mesmo não
há nenhuma, a não ser as músicas ao piano que são preferência do
casal protagonista.
Georges e
Anne Laurent já estão velhos, e o filme trata de
observar o amor dos dois nos momentos em que fica realmente difícil
amar alguém.
Claro que essa descrição
parece de filme pra assistir com a esposa que vai chorar durante a
sessão.
Porém, conforme eu
disse: esqueça os maneirismos.
Eu nem ia reclamar se o
diretor tentasse aproveitar o contexto pra levar a plateia às
lágrimas.
Seria o caminho fácil.
No entanto, esse não é
o cinema de Haneke, que tem um modo particularmente áspero de
ver as coisas, e em “Amor”, ele disseca a relação do
casal sem nos permitir mais do que a função de visita que assiste
sem poder opinar ou escolher certos ou errados.
Fato que o filme dialoga
melhor com as experiências do público, e o tratamento
tentando prolongar uma vida cada vez mais ausente é algo que eu
presenciei de perto duas vezes, e até por isso me assombrou perceber
o realismo extremo expresso na história, dos momentos iniciais, da
compra de novos móveis e a adaptação necessária das pessoas
próximas, até a amargura e aceitação necessária de que a própria
pessoa não quer mais continuar com isso, prolongando algo que passa
a ser um fardo aos demais.
Nisso tudo é possível
encontrar porquês para o título, enquanto Haneke posiciona a
câmera e a esquece lá, filmando cada breve detalhe do cotidiano que
logo não traz satisfação nenhuma a quem o vivencia.
E é claro, o fato de contar com Jean-Louis Trintignant (Georges) e Emmanuelle Riva (Anne) é fundamental, porque é na atuação irretocável dos dois que se encontra o cerne do que Haneke tenta transmitir.
Ambos conferem uma
trágica visão dos finalmentes da vida humana, em que independente do tipo de arte que colecionamos, ou a profissão ou relacionamento ao
qual uma vida é dedicada, o desfecho da trajetória humana não
vai ser em essência muito diferente do que Georges e
Anne enxergam com tamanha proximidade.
Não é algo que
estejamos habituados a assistir, porque não é algo que traga
qualquer alegria ou pareça entretenimento pra sair da sessão com um
sorriso no rosto.
Ainda assim, da crueldade
do relato, à simplicidade com que é mostrado, “Amor” é
um filme perfeito.
Quanto vale:
Amor
(Amour)
Direção: Michael Haneke
Duração: 127 minutos
Ano de produção: 2012
Gênero: Drama
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