O Último Grande Herói (1993)


Bem sabemos que se o mundo fosse justo, Segunda-feira não existiria, dinheiro brotava em árvore, ninguém engordaria tomando refrigerante e o filme O Último Grande Herói seria considerado um grande sucesso. Sim, isso mesmo que você leu, O Último Grande Herói, longa-metragem dirigido por John MacTiernan e que injustamente apanhou da crítica mais que o Loki nas mãos do Hulk.

Injustamente? Sim. Vamos aos fatos: O Último Grande Herói foi vendido para o público como se fosse mais um simplório filme de ação. Contudo, ele não era uma obra de ação comum e quem esperava ver uma produção repleta de tiros e pancadaria igual aos 2.342450 filmes que são lançados a cada segundo, se decepcionou profundamente, pois acabou assistindo a uma intrigante obra metalinguística que subverte todos os clichês de tramas aventurescas feitas até então. Logo, muitos não compreenderam quando se depararam com Arnold Schwarzenegger, um dos símbolos do vilipendiado cinema brucutu, tirando sarro dos filmes que o alçaram ao estrelato. Em resumo: crítica e público não apreciaram ver o gigante austríaco cuspindo no prato que comeu.

Mas por qual motivo, razão ou circunstância, Schwarzenegger estaria a enxovalhar com um gênero tão querido e popular?


Pois bem, em 1988, o diretor John McTiernan mostrou ao mundo um longa-metragem chamado Duro de Matar, em que o protagonista é um policial que sangra, cansa, faz piadinhas para irritar a bandidagem, é humano, é vulnerável. Enfim, é um protagonista bem diferente de máquinas de matar interpretadas por Stallone, Norris e o próprio Schwarzenegger que, sozinhos, exterminavam exércitos inteiros como se estivessem dando voltinhas em um parque de diversões.

A partir de Duro de Matar o cinema de ação então concluiu que deveria se reinventar e que heróis imbatíveis logo estariam fadados ao limbo do esquecimento. Portanto, não foi à toa que o próximo projeto do diretor John McTiernan tenha sido justamente um filme que refletisse essa mudança, essa possível morte do action hero. Diante disso, também não foi à toa que esse filme tenha recebido a alcunha The Last Action Hero, aqui no Brasil recebeu o aportuguesado título de O Último Grande Herói.
 
Mas e porque as inúmeras referências no filme?


Vale lembrar que em meados dos anos 90, Quentin Tarantino ganhou o mundo quando viu que era divertido rechear os seus filmes com referências, homenagens espertas e demais elementos que hoje parecem constituir uma cartilha que é seguida à risca por todo e qualquer cineasta que almeje fazer um filme “fodão”.

Mas antes de Tarantino, o filme O Último Grande Herói já jogava referências na cara do espectador, porém o que muitos não compreenderam na época é que tais referências, mais do que mera galhofa, sátira e gozação, eram acima de tudo, homenagens aos “finados” heróis de ação.


Reparem nos elementos constituintes do Último Grande Herói: O protagonista fodão macho alfa está lá. O chefe que tenta controlar as atitudes do protagonista fodão está lá. O vilão canastrão e com planos infalíveis a lá cebolinha também está lá. No entanto, o roteiro, de forma muito engenhosa, coloca no meio disso tudo um elemento diferencial. Um elemento que a todo instante afirma que tudo isso é um amontoado de clichês. Esse elemento é um garotinho imberbe que, ironicamente, é fã desse tipo de filme. 

Na trama, o tal garoto venera com fervor religioso uma franquia protagonizada por um personagem chamado Jack Slater. Eis que o pirralho ganha um ingresso para assistir ao mais recente lançamento da franquia nos cinemas. E aí entra a genial sacada metalinguística do roteiro: o tal ingresso possui poderes mágicos e faz que o seu possuidor tenha a capacidade de literalmente entrar no filme. Ou seja: o sonho de todo e qualquer infante que, na década de 80, cresceu assistindo Chuck Norris e cia se torna realidade. (A metáfora a respeito da magia do cinema aí nesse caso é soberba).

Ao entrar no filme do seu herói preferido e viver altas aventuras ao lado do carismático “Schwarzza”, o guri disseca os clichês de todas as produções oitentistas. A todo momento o moleque tenta alertar Jack Slater que eles estão dentro de um longa-metragem de pancadaria. Sendo assim o guri questiona porque não há mulheres barangas perambulando pelas ruas. Ele indaga o motivo das armas nunca ficam sem munição. Ele quer saber a razão pela qual é fácil quebrar vidros dos carros com as mãos nuas. Enfim... O garoto aponta tudo aquilo que quem nutre um certo carinho por filmes do gênero já conhece. Inclusive, a cena em que o próprio guri se reconhece como o tradicional “parceiro do herói” (sidekick) é genial.

A quantidade de detalhes que aparecem na película e faz a festa dos catadores de referências também é algo digno de nota. Há o Schwarzenegger “interpretando” Hamlet, há homenagem ao Twilight Zone, há também participação de James Belushi, Van Damme e até o Stallone estampado em um pôster no melhor estilo Terminator


Além disso, a trilha sonora contém bandas do porte de Alice in Chains, Aerosmith, Anthrax, Megadeth e… Mozart!! (Aliás, Mozart não está aí à toa, quem ver o filme vai sacar logo).


Acredito que, nos anos 90, o último projeto tão divertido assim em que o ex-governador participou foi True Lies, dirigido por James Cameron.

Quem está por trás do sagaz roteiro é um cidadão chamado Zak Penn, que redigiu o argumento do divertidíssimo Vingadores, mas por outro lado, escorregou no tomate quando concebeu X-Men 3 e Elektra.

Shane Black, que atuou ao lado de Arnoldão em Predador, também é um dos roteiristas. Black, para quem não lembra, roteirizou Máquina Mortífera, o outro injustiçado Deu a louca nos monstros e o excelente O Último Boyscout. No entanto, defecou longe do penico quando dirigiu Iron Man 3.

E o elenco de O Último Grande Herói é um time de primeira: Charles Dance interpretando um vilão que utiliza lentes oculares de gosto duvidoso, Tom Noonan (vilão de Robocop 2), F. Murray Abraham, Anthony Quinn e uma participação do Sir Ian McKellen interpretando A Morte em uma clara relação ao Sétimo Selo do Ingmar Bergman. É isso mesmo, no currículo do cara que já foi Gandalf e Magneto, há também A Morte.

Charles Dance, que também foi vilão no filme O Rapto do Menino Dourado

Aliás, é interessante notar que, ainda que possua tantas referências quanto um X-Bacon tem de gordura, o longa-metragem funciona muito bem. Algo que lembra muito a trilogia cornetto do Edgard Wright, que também homenageia traços da cultura pop sempre com um ritmo preciso.


 
Ainda assim é difícil efetuar um diagnóstico exato a respeito do fracasso do filme. Marketing mal planejado? Talvez. Lançado na mesma época do primeiro longa da franquia Jurassic Park? É uma hipótese? Libra  estava em conjunção com Marte? Quem sabe. Todas essas alternativas juntas? Também é provável. O fato é que ele foi indicado a seis prêmios do Framboesa de Ouro. Diante de tal injustiça só podemos falar a máxima proferida por Jack Slater: “Its a big mistake!!” 



Recomendado para: Quem não precisa assistir um longa-metragem 3D para poder "entrar no filme".

Título: O Último Grande Herói
Direção: John McTiernan
Ano de lançamento: 1993
Tempo de duração: 130 minutos
Gênero: Ação/Policial




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