Redenção (2011)



Aparentemente os critérios de seleção de títulos de filme em português ocorrem em um patamar de raciocínio tão elevado, que são capazes de afastar até o eventual público-alvo de uma produção.
Sei que isso não é de hoje, mas o filme em questão nessa postagem tem por primeira surpresa exatamente o fato de que o seu título original é “Machine Gun Preacher” (Pastor da Metralhadora, que reconheço, não seria um título muito atraente pra muitos), que em terras tupiniquins foi solenemente batizado de “Redenção”.
Por que isso?
Seria pura trollagem?



Quem sabe?
Mas prefiro apostar em uma equivocada e superficial interpretação de sinopse (o que é redundante. Não existe “análise” de sinopse que consiga não ser superficial).
A favorita dentre as possibilidades é que alguém leu “Machine Gun Preacher? Mas é a história de um ex-chapadão que agora ajuda criancinhas! Sabe que nome seria perfeito? Redenção!”.
Simples assim.
Só quem perde é o filme do diretor Marc Forster, e o espectador que sofre de alergia a filmes melosos com histórias de superação em formato lenga-lenga, algo que Machine Gun Preacher com certeza não é.
Além disso, Machine Gun Preacher é baseado em fatos reais, o que aumenta essa tentativa geral de enquadrá-lo na categoria de filme pra estimular choredo.



O filme conta a história de Sam Childers (interpretado pelo Gerard Butler), ex-traficante, ex-presidirário, e usuário costumaz de medicamentos não costumazes na farmácia mais perto de sua casa, pode ter até alguma qualidade, mas não tem feito uso de nenhuma faz tempo.
Um ponto de mudança está em sua esposa Lynn (Michelle Monaghan), que encontra na Fé uma alternativa ao ciclo rotineiro ao qual o casal está ligado, envolvendo os crimes de Sam, e seus respectivos problemas com a polícia. Além disso, a filha pequena também exerce papel fundamental nesse processo, afinal, o carranca recém saído da prisão mal a conhece, e numa dessas até volta pra uma estada atrás das grades se a situação não mudar.
Esses são os fatos. Mas a maneira como são contados nesse momento inicial é que prejudicam bastante o longa-metragem.
O começo do filme é um tanto apressado, e não mostra essa transição com os devidos detalhes. Parece mesmo sofrer de um receio de que o público possa se entediar, ou ser movido por preconceitos pra escolher outro filme que não tenha nada a ver com Cristianismo.
O que é uma pena, porque essa é a base pra etapa em que o filme se encontra.



Porém, com algum esforço do diretor, as coisas começam a entrar nos eixos.
Enquanto vive uma fase diferente de sua vida, Childers vê uma oportunidade de desempenhar os preceitos cristãos de uma forma um tanto mais prática.
O “amar o próximo” torna-se algo a ser efetivado e não apenas retórica, e ele parte então para uma forma bem particular de humanitarismo que envolve tiroteio, construção civil, e sacrifício pessoal.
Isso tudo ao confrontar a situação de populações africanas na África, o que o motiva a deixar de lado o benefício próprio, e investir recursos, tempo, e pôr a própria pele em risco diante de guerrilheiros, e um regime ditatorial que vê multidões de pessoas não diferentes de um campo de tiro.
Um grande diferencial do trabalho do diretor é não virar a câmera nos momentos mais violentos.
É um filme a respeito de Fé Cristã em uma forma não obstinada em ver diferenças, ou criar separação. E sim, em refletir um exemplo.
Afinal, se Jesus Cristo viveu pra abdicar de si mesmo em prol dos outros, por que seus seguidores agiriam diferente?
É assim que o Sam Childers do filme profere palavras ásperas em sua Igreja, com a mente ainda manchada pelas cenas de genocídio que viu na África.


Várias são as vezes em que o roteiro lida com os questionamentos do protagonista nessa guerra que muitos dizem não ser dele, mas pra um cristão nada tradicional que nem Childers pouco importa, e ele não se incomoda em recorrer às armas diante de um ataque ao orfanato que ergueu pra acolher os órfãos das muitas investidas do exército rebelde, que empilha cadáveres em toda aldeia pela qual passa.
O personagem de Gerard Butler, é claro, não é um exemplo cristalino de serenidade, e padrões convencionais de espiritualidade.
O roteiro de Jason Keller nem tenta fingir isso.
Nos seus dilemas e rotina que envolve não ver a família nos EUA, pra se esforçar pra que pilhas de corpos de crianças não apareçam carbonizadas no dia seguinte, ele por vezes fraqueja diante de uma realidade que não presenciaria se estivesse confortável sentado em um banco da Igreja do seu bairro.



Independente de não estar imune a alguns problemas típicos do seu gênero cinematográfico, e de que a narrativa tome alguns rumos bem convencionais em certos momentos, o diretor conseguiu equilibrar as coisas não optando por uma versão melodramática da vida do figura real que é peça central no seu filme.
Tem seus problemas, e são vários de ordem narrativa.
De todo modo, Machine Gun Preacher é sim um filme que mostra em suas cenas violentas, e nas escolhas de seu protagonista um tipo de herói falível, mas nem por isso de atitudes menos eloquentes.
Na verdade, o efeito é muito mais forte, e até inspirador a partir de seus questionamentos, do que uma corriqueira e chorosa história de “redenção” hollywoodiana.


Quanto vale:


Redenção. Recomendado para: conhecer uma daquelas histórias impressionantes baseadas em fatos, que inexplicavelmente tão pouca gente conhece.

Redenção
(Machine Gun Preacher)
Direção: Marc Forster
Duração: 129 minutos
Ano de produção: 2011
Gênero: Ação/Drama

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