Eu nem sou de exigir exageros de
fidelidade aos quadrinhos. Pra mim, por exemplo, X-Men: Primeira Classe é um dos melhores filmes de HQs já realizados.
Só precisa manter a essência, e não
constranger com alterações descabidas visualmente ou quanto ao
conteúdo da trama e personalidade dos personagens envolvidos.
Sendo assim, tenho que dizer que por
mais divertido que até fosse o primeiro
filme, Kick-Ass: Quebrando Tudo, pelo visto ninguém se importou em incluir o que
havia nas entrelinhas da primeira série com o personagem, escrita
pelo Mark Millar, e que realmente o destacou frente a enxurradas de
novos heróis nas páginas.
Mas tudo bem, até.
No que se propõe, Kick-Ass (o filme)
até que é engraçado, e fiel até por ali. Um filme de origem e que sofreu com as dificuldades que isso acarreta, conseguindo ser franquia.
O segundo filme já continha na
pré-produção a megalomania do mesmo Mark Millar que vem inventando
um próprio universo de quadrinhos de heróis, e que sonha em jogar
tudo isso no cinema assim que tiver oportunidade.
Tanto
as séries em HQs Hit-Girl: Prelúdio para Kick-Ass 2, quanto Kick-Ass 2 serviram de base para o
filme dirigido por Jeff Wadlow.
Essa
ideia, tendo lido ambas as HQs, é que nem quando se assiste o começo
de uma videocassetada manjada em que um cara tenta se exibir no
brinquedo de criança pequena no pátio de casa só porque é domingo
e alguém desafiou ele na frente da mulherada.
Hit-Girl e também Kick-Ass 2 são séries de HQs as quais, apesar de voltadas a
entretenimento rápido e mutilação, primam por um roteiro bem amarrado.
Desse
modo, claro que tem suficiente informação, e não somente a
pancadaria.
Por
consequencia, sintetizar demais elas incorre na cagada de fazer
muito do que já habitava numa linha tênue entre o fantástico e a
falta de sentido, descambar por completo pra segunda opção.
Na trama, o nerd Dave Lizewski (Aaron
Taylor-Johnson) passa a ser treinado pela Mindy “Hit-Girl”
McCready (Chloë Grace Moretz), enquanto o vilão Chris D'Amico (Christopher Mintz-Plasse) busca sua
vingança contra o heroi pelo uso indevido de uma bazuca no seu
âmbito familiar.
No entanto, ainda que essa receita de bolo descrita acima em teoria seja mais do que suficiente pra catalisar porradaria louca, o primeiro problema é que o filme Kick-Ass 2 desde os minutos iniciais
sofre de uma urgência em cortar pra próxima cena, e incapacidade de
envolver o público, o que faz parecer que nada foi aprendido com o
primeiro filme.
Nada das qualidades do longa-metragem
de 2010 parece ter sido mantido e sempre que algo parece seguir ligeiramente os acertos dos quadrinhos, sobra alguma ideia
estapafúrdia pra parecer que o filme é visionário e não se prende
ao material original.
Com uma aceitação do nonsense
enquanto viés único do universo cinematográfico do personagem, a
sensação é de estar assistindo um fanfilm muito mal feito, em que
nem o fato de estar liberto das amarras da censura (o filme novamente
tem censura R) o permite ter coragem pra utilizar de maneira correta
as boas ideias presentes nos quadrinhos.
Curioso alguém pensar em adaptar algo
pro cinema e simplesmente desconsiderar tudo que havia na fonte a ser
adaptada. Quase como se dissessem: “essa HQ não é boa pra virar
filme. Se a gente for fazer filme, temos que mudar tudo”.
Kick-Ass 2 se assemelha muito (em
resultado, e não em tempo que separa os filmes) a qualquer dessas
franquias que alguém decide prolongar depois de uns anos, e ocorre um
filme pobre de ideias e absolutamente dispensável que não aproveita
o fato de não precisar contar origens de personagens, e todos os
etcs que limitam um primeiro episódio de franquia.
Além de o filme ser muito comum no geral, e não
haver nada demais nas costumeiras menções à cultura pop, ou
referências a outras HQs de Mark Millar, a presença de Jim Carrey
ou John Leguizamo em nada acrescentam, ainda que os dois desempenhem seu trabalho com a competência de quem é experiente no ramo do cinema.
E quanto a ser violento (algo que
geralmente compensa pra boa parcela do público) nem isso o filme de
Wadlow é. Há aqueles momentos em que algum sangue é espirrado, mas
no geral as lutas são apáticas e sem graça alguma.
A Hit-Girl novamente está mais do que confortável na arte do desmembramento, o que mais reforça o pensamento de que teria sido muito, mas muito inteligente mesmo ter simplesmente realizado um filme chamado "Hit-Girl", contendo a trama divertida de sua série em quadrinhos, e depois realizar um Kick-Ass 2, até porque, o personagem-título é mais adereço e não tem nada nele que justifique ser ele o protagonista, e não a icônica guria que sempre é o fator-destaque.
E não adianta encher de vilões e cenas
exageradas, se tudo faz parte de um típico besteirol americano, em
que nem o diretor consegue levar a sério o trabalho por ele
desenvolvido.
Quase como se fosse naqueles tempos em
que as adaptações de quadrinhos ainda eram sub-material pra
adaptação.
O roteiro investe muito mais no humor
de constrangimento, mas sem a parte do humor, especialmente no ato
dedicado ao universo das patricinhas-clichê.
Queria dizer que, ao menos o filme é
divertido, ou quem sabe que
a trilha sonora é marcante, ou talvez que o vilão se destaca.
Mas por que eu ia mentir pra vocês?
A coisa talvez mais marcante, e lamentável, é a dedicação de tempo e dinheiro pra empregar piada de peido, vômito e churrio, no filme (isso tudo é literal. E antes que alguém pergunte: não. Não existe nos quadrinhos) só pra tentar criar graça e convencer o espectador a não abandonar o cinema, na base da jogada desesperada.
E a ausência de Matthew Vaughn na direção (agora produtor do filme) talvez não fosse algo tão problemático, não fosse pela contratação de um diretor tão medíocre pra substituí-lo.
Em um longa-metragem que foi criado com a pretensão de ganhar público pela
mera menção ao seu hypado predecessor, e buscando regurgitar
citações, além de ganhar solidariedade do espectador
pelo fato de ser um “corajoso” filme de baixo orçamento, se sobressai a covardia de se escorar em um roteiro que fica pior se pensarmos no quanto o Marvel Studios tem conseguido criar cinema aprazível com ação e humor.
Coragem é assistir até o final.
Quanto vale:
Recomendado para: quem sonhava em assistir um filme de super-heroi homenageando o filme "As Branquelas".
Kick-Ass 2
(Kick-Ass 2)
Direção: Jeff Wadlow
Duração: 103 minutos
Ano de produção: 2013
Gênero: ComédiaSign up here with your email