Dossiê Evil Dead



Diante da horda de remakes que infestam o atual cinema mainstream, uma das mais comentadas é a do filme Evil Dead, um verdadeiro clássico da arte podreira lançado em 1981.

Evil Dead é uma obra repleta de violência explícita, onde sangue, pus, miolos e intestino grosso são expostos ao público sem vergonha nenhuma de causar repulsa. E isso possui valor artístico? É óbvio que sim. Arte é tudo que causa uma reação no público e tal reação não necessita ser exatamente a mesma que a gente possui ao assistir uma afável animação da Pixar.

Sam Raimi
Foi mais ou menos com esse pensamento que Sam Raimi presenteou o mundo com o destrambelhado Evil Dead, que no Brasil recebeu o título de A Morte do Demônio.

As origens desse longa-metragem remontam ao ano de 1978, quando Sam Raimi dirigiu e escreveu o curta-metragem Within in the woods, produção tosquinha, mas feita com carinho e esmero em formato Super 8.


A trama narrava as desventuras de quatro jovens que foram passar um fim de semana agradável em uma cabana que ficava próxima de um antigo cemitério indígena. Para o completo azar deles, o que era para ser momentos de diversão e curtição acabou se tornando um horrendo banho de sangue quando forças sobrenaturais chegaram para acabar com a (vida) e a alegria dos incautos jovens.

Esse curta-metragem, que já contava com o canastrão Bruce Campbell como um dos protagonistas, foi o ensaio para o clássico Evil Dead, que foi lançado três anos depois. Além de ator, Campbell participou também como um dos produtores executivos do curta-metragem.

Evil Dead 


Quando Evil Dead foi lançado, as pessoas presenciaram ali o que seria o encontro do “Exorcista com o Massacre da Serra Elétrica”, até porque a história mostra de forma explícita boa parte do elenco (cinco pessoas no total) tendo seus corpos possuídos por demônios, com direito a mudança de voz, olhos esbranquiçados e fisionomia putrefata. Tudo isso em um festival de sangue falso e borracha, já que o máximo de efeitos especiais que o orçamento permitiu foram algumas cenas com stop motion (sim, no início dos anos 80 computador mesmo servia mais para jogar pac man, pois haviam poucos softwares voltados para criar toneladas de efeitos especiais como hoje).


A sinopse era bem parecida com a do curta-metragem Within in the woods, só que em A Morte do Demônio, Ash Williams (Bruce Campbell) e os seus amigos não estão próximos de um cemitério indígena, mas sim, eles estão diante de entidades maléficas oriundas das páginas carcomidas de um livro amaldiçoado.

Durante algum tempo esse longa-metragem chegou a ser proibido em alguns países, o que apenas aumentou a sua mítica de filme maldito, mas assim mesmo, o tempo fez justiça e atualmente o primeiro Evil Dead pode ser colocado perfeitamente na lista das produções mais perturbadoras da década de 80, ao lado de preciosidades do porte de Cannibal Holocaust (1980), Re-Animator (1985) e The Beyond (1981).

Evil Dead 2 (1987)


Pelo que eu lembro da minha tenra infância, o primeiro Evil Dead existia em poucas locadoras na cidade onde eu morava, porém esse segundo, com a sua capinha mostrando uma caveira sem vergonha encarando o espectador, era praticamente onipresente em qualquer casa do ramo.

Ao contrário do que possa parecer, o Evil Dead 2 não é uma sequência direta do primeiro filme. Na verdade, pelo menos eu considero assim, esse longa-metragem é uma refilmagem. Afirmo isso porque o primeiro filme termina com um final em aberto.

Já esse esse segundo filme já inicia com o protagonista (novamente interpretado por Bruce Campbell) parecendo ignorar toda a desgraceira que ocorreu na história anterior. Ou seja, ao meu ver, Sam Raimi apenas aproveitou o argumento e o personagem principal do primeiro longa-metragem e concebeu esse segundo. 

Ainda mais que em Evil Dead I aparecem cinco amigos presos na cabana amaldiçoada, enquanto no segundo a história começa com o protagonista e a sua namorada. Os personagens restantes aparecem apenas mais tarde e, como se trata de um filme de terror, somem com a mesma facilidade que entraram.


Evil Dead 2, no Brasil chamado de Uma Noite Alucinante 2 - Mortos ao amanhecer, é uma "versão melhorada" do primeiro. Todo o dinheiro que Sam Raimi não tinha para fazer o anterior, pelo jeito foi usado nesse. 

Os efeitos especiais estão melhores e o roteiro abre espaço para algo que na versão anterior não havia: o humor. É claro que é um humor nefasto e bem peculiar, mas ainda assim, humor. Inclusive o ator Bruce Campbell possui longas cenas solo onde ele teve liberdade para gritar, se espernear e fazer mais caretas que um Jim Carrey com intestino preso. 

Vale destacar também que foi em Evil Dead 2 que o seu personagem Ash Williams ganhou o status de protagonista da trama, tornando-o um ícone do universo nerd, quase como um Indiana Jones, só que sem chapéu e chicote, mas sim com uma espingarda e uma moto-serra. O cara se tornou até mesmo personagem de história em quadrinhos ampliando assim a franquia Evil Dead.


Outro aspecto interessante é que em Evil Dead 2 o livro maldito (que desperta os espíritos malignos e é o culpado por todo o excesso de nojeiras na tela) possui mais espaço na trama, podendo ser considerado até mesmo um personagem a mais. 

O referido grimório citado no filme é o Necronomicon, livro ficctício que é mencionado em algumas histórias do escritor norte-americano Howard Phillips Lovecraft.

O Necronomicon na vida real não existe, mas alguns pesquisadores que estudam a obra de Lovecraft acreditam que tal publicação realmente exista (aham... o Papai Noel também acredita no Necronomicon e no Acre).


Em termos técnicos, o filme ficou famoso por um recurso de câmera que mostra o ponto de vista dos espíritos malignos perseguindo os personagens.

O filme Evil Dead 2, devido aos elementos cômicos jogados na narrativa, não chega a ser tão repulsivo quanto o primeiro, mas assim mesmo, possui boas doses de violência e não é o filme recomendado para impressionar a garota no primeiro encontro romântico (para isso existe aquele filme da Amelie Poulain).

Evil Dead 3 - Army of Darkness (1992)


Também conhecido como Uma Noite Alucinante 3 ou apenas como Exército das Trevas ou inclusive de Bruce Campbell vs Army of Darkness, esse longa-metragem é a sequência direta de todas as loucuras ocorridas no filme anterior.

Nesse filme, Bruce Campbell, ou melhor, Ash Williams cai em um vórtice temporal e vai parar na Europa Medieval, época de caça às bruxas, cavaleiros templários, feudalismo e cenários que lembram muito as capas dos CDs do Blind Guardian.

A abordagem desse filme em relação aos dois anteriores segue outro caminho. Se os dois primeiros mostravam um banho de sangue, suor e lágrimas, esse terceiro descamba definitivamente para o humor.

Tanto que, em meados dos anos 90, essa sequência chegou a ser exibida pela Rede Globo na Tela Quente e até mesmo domingo à tarde, após As Aventuras do Didi, pouco depois da família brasileira degustar um suculento churrasco (algo inimaginável diante da carnificina do primeiro Evil Dead, por exemplo).

Enfim, acredito que o objetivo de Sam Raimi e de Bruce Campbell não era fazer um filme de terror, mas sim uma aventura que usa os elementos de terror apenas como um complemento.

Além disso, o personagem Ash assume de vez o posto de “herói brucutu”, enfrentando de igual para igual hordas inteira de cadáveres putrefatos, tanto que a própria capa do filme já mostra o personagem como um protagonista “macho alfa”, fazendo uma óbvia referência aos filmes medievais de capa e espada.


E as brincadeiras e as referências de Sam Raimi não acabam aí. Em uma divertida cena há ainda uma alusão ao filme O Dia em que a Terra Parou, verdadeiro clássico da ficção científica lançado em 1951.

Após o fim da trilogia, Bruce Campbell escreveu livros, apareceu em alguns filmes, protagonizou séries de TV e em algumas ele até fez algumas pequenas aparições como coadjuvante.

Evil Dead 3 possui dois finais distintos que podem ser conferidos em algumas versões do DVD. Os dois finais clamam por uma sequência, mas ao que tudo indica elas apenas irão surgir quando Bruce Campbell ganhar um Oscar, ou seja, nunca. Até musical do Evil Dead existe, mas uma continuação nunca foi falada.


Até porque Sam Raimi, após a trilogia, gradativamente subiu no topo da cadeia alimentar de Hollywoody. Em 1995 ele dirigiu o western Rápida e Mortal (com Sharon Stone no elenco), dirigiu também um terror chamado O Dom da premonição (com Keanu Reeves e Cate Blanchet) e, finalmente, foi o responsável por levar às telas a milionária trilogia do Homem Aranha

O único filme de terror destrambelhado que ele fez nesse período é o incompreendido e injustiçado Arraste-me para o Inferno, lançado em 2009 (infelizmente tem gente que leva esse filme a sério e ignorou o fato de que ele não passa de uma brincadeira bem aos moldes de histórias como Contos da Cripta).

Mas já que um Evil Dead 4 não aparece, eis que surge um...

Remake (2013)


Sim... a refilmagem de Evil Dead vai chegar aos cinemas no dia 12 de abril desse ano. Sam Raimi, Robert Tapert e Bruce Campbell produziram a refilmagem, já a direção ficou a cargo do uruguaio Fede Alvarez, o cineasta que impressionou Sam Raimi ao lançar em 2009 o curta-metragem Ataque de Pánico. Nesse curta-metragem, que custou míseros 500 dólares, robôs alienígenas fazem um estrago horrendo na capital Montevidéu.


O roteiro ficou nas a mãos de Rodo Sayagues e da Diablo Cody, a moça que redigiu o roteiro de Juno (uma verdadeira bomba soporífera) e de Garota Infernal (aquele com a Megan Fox e com Amanda Seyfried).

Muitos acreditam que, para agradar a essa geração criada a leite com pêra e que cresceu conhecendo basicamente Uma Noite Alucinante 3, a refilmagem iria perder a sua essência violenta e repulsiva. O que seria uma tremenda injustiça, já que vivemos em uma época em que o sangue corre livremente em franquias como Jogos Mortais e Wrong Turn, sendo assim, porque Evil Dead, um dos filmes responsáveis por trazer violência explícita ao cinema teria que pegar leve?


O trailer, ao que tudo indica, mostra que a refilmagem não irá economizar nas cenas mais fortes.

Obviamente não será um filme para toda a família e também não terá um roteiro aprofundando grandes questões sobre o Sentido da Vida (o Monty Phyton já fez isso), mas será uma boa pedida para revisitar uma franquia que nasceu lá no início dos anos 80, feita na raça e com pouco dinheiro.
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